COLABORADOR: RENAN DA SILVA
A ignorância ao alcance de todos
Stanislaw Ponte Preta
Já não me lembro qual o motivo do almoço. Lembro-me,
isto sim, que íamos caminhando, quando Alvinho disse, em voz alta:
–
Leônio Xanás
–
O quê? – perguntei, e Alvinho explicou que Leônio Xanás
era o nome do pintor que estava pintando seu apartamento. Até mostrou
um cartãozinho, escrito “Leônio Xanás – Pinturas
em geral – Peça orçamento”.
–
Hoje acordei com o nome dele na cabeça. A toda hora digo Leônio
Xanás – contava o escritor. Ainda agorinha, ao entrar no lotação,
disse alto Leônio Xanás e levei um susto, quando o motorista respondeu: “Passa
perto”. Ele pensou que estava perguntando por determinada rua e foi logo
dizendo que passava perto, sem ao menos saber que rua era.
Foi aí que nos nasceu a vontade de experimentar a sinceridade do próximo
e nos nasceu a certeza de que ninguém gosta de confessar-se ignorante
mesmo em relação às coisas mais corriqueiras. Entramos
numa farmácia para comprar Alka-Seltzer (pretendíamos tomar vinho
no almoço) e Alvinho experimentou de novo, perguntando ao farmacêutico:
–
Tem Leônio Xanás?
–
Estamos em falta – foi a resposta. (...)
E assim foi a coisa. Ninguém foi capaz de dizer que não conhecia
nenhum Leônio Xanás ou que não sabia o que era Leônio
Xanás. Nem mesmo a gerente de uma loja de roupas que – geralmente – são
senhoras de comprovada gentileza. Entramos numa elegante magazine do centro
da cidade para comprar um lenço de seda para presente. Vimos vários,
todos bacanérrimos, mas – para continuar a pesquisa – indagamos
a vendedora:
–
Não tem nenhum da marca Leônio Xanás?
A mocinha pediu que esperássemos um momento, foi até lá dentro
e voltou com a prestativa senhora gerente. Esta sorriu e quis saber qual era
mesmo a marca.
–
Leônio Xanás – repeti, com esta impressionante cara de pau
que Deus me deu.
Madame voltou a sorri e disse:
–
Tínhamos, sim, senhor. Mas acabou. Estamos esperando nova remessa.
Foi uma pena não ter. Compramos de outra marca qualquer e fomos almoçar.
Foi um almoço simpático com um velho amigo. Lembro-me que, na
hora do vinho, quando o garçom trouxe a carta, Alvinho deu uma olhadela
e disse, em tom resoluto:
–
Queremos uma garrafa de Leônio Xanás tinto.
O garçom fez uma mesura:
–
O senhor vai me perdoar, doutor. Mas eu não aconselho esse vinho.
Devia ser uma questão de safra, daí aconselhar outro:
–
O Ferreirinha não serve?
Servia.
É
, irmãos, mal de muitos consolo é, mas ignorante que existe, às
pampas, ninguém quer ser.
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